domingo, 26 de maio de 2013

O Brasil e o perdão (incluso o das dívidas externas de países africanos).

O Brasil e o perdão (incluso o das dívidas dos países africanos).

 

Há alguns anos escrevi um artigo que criticava – "apenas" sob o ponto de vista jurídico/constitucional – decisões do então Presidente da República que resultavam no perdão total ou parcial de dívidas de países africanos, para com o Brasil. Naquele texto ponderei – e ainda mantenho as ponderações, neste aspecto – que a matéria deveria, ao menos, ser previamente comunicada ao Congresso Nacional (embora ainda ache que semelhante perdão de dívidas careceria de referendo deste mesmo Congresso), porque ali estão os (ao menos em tese) representantes do nosso povo (e se algum país tem dívida monetária para com o Brasil, tem-na para com o nosso povo, em última instância).


Hoje, este artigo vem para louvar mais uma atitude de perdão de dívidas africanas, para conosco. Desta feita, a Presidência da República brasileira decidiu perdoar cerca de R$900.000.000,00 (novecentos milhões de reais) que quase quinze países da África possuem, em relação ao Brasil. Se o valor parece grande demais, basta dizermos que não é nem a metade do que já foi gasto nos estádios para a Copa do Mundo de Futebol FIFA 2014...


A atitude brasileira não é nem a primeira nem a que perdoa maior soma de recursos financeiros, em benefício das nações mais pobres do mundo. Anos atrás, sob o governo de George Bush, nos EUA, e Tony Blair, na Inglaterra, os músicos/artistas Bob Geldof e Bono Vox conseguiram sensibilizar esses dois países e obtiveram (após muito esforço, reuniões, "'lobbies' do bem", shows de rock – o maior deles o Live Aid – e discursos) o perdão de grande parte das dívidas externas de países africanos. No entanto, os perdões feitos pelo Brasil, nos últimos anos, tem talvez maior peso moral, maior significado internacional e humanitário, porque é mais do que sabido que nossa riqueza e nosso nível de desenvolvimento sócio-econômico não se aproxima senão minimamente daqueles que EUA e GBR ostentam, mesmo em tempos de crise econômica mundial (basta vermos os cem milhões de dólares que, há dois meses, Obama destinou apenas para pesquisas científicas em torno do cérebro humano e suas potencialidades).


Nossa Constituição proclama, em seu emblemático preâmbulo:

"Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL."


E nos parágrafos imediatos, elenca os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: construir uma sociedade livre, justa e solidária; garantir o desenvolvimento nacional; erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. E o artigo 4º prescreve que "A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais" pelo princípio (dentre outros) da "cooperação entre os povos para o progresso da humanidade".


Naturalmente, há interesses e objetivos políticos e macroeconômicos, junto ao perdão em comento; ele reforça a imagem do país, não só entre as nações africanas; ele auxilia a entrada de empresas brasileiras, nos países agraciados com a remissão; ele favorece o aprimoramento de nossa balança comercial etc. etc. etc...


Mas quem disse que aquele que perdoa também não é beneficiado pela bondade concedida? Aliás, sob a ótica espiritualista – mais ainda sob a ótica cristã – aquele que perdoa é o maior beneficiado pela dádiva ofertada.


Nosso país tem uma tradição de perdão, de misericórdia. Não temos pena de morte (salvo em caso de guerra declarada e – perdoem-me por voltar ao tema   em caso de aborto por estupro e/ou anencefalia ou risco de vida para a mãe), nem de banimento, nem perpétuas, nem de trabalhos forçados. Se somos pobres, nosso sistema de saúde pública é universalizado (algo que nem os ricos EEUU nem o carismático Obama conseguem implementar completamente, sem lutas políticas e jurídicas imensas). Se somos pobres, temos um programa de minimização dos efeitos da miséria (não importa que partido o criou). Se somos pobres, não recorremos às armas nucleares para impor medo aos países vizinhos. Se somos pobres, somos capazes de perdoar milhões em dívidas de outras nações...


Essa é a tradição brasileira. Essa é a natureza de nosso povo[1].

 



[1] "Brasil perdoa quase US$ 900 milhões em dívidas de países africanos. Atualizado em  25 de maio, 2013 - 21:07 (Brasília) 00:07 GMT. {§} Visitas de Dilma à África são tentativa de intensificar relações diplomáticas e comerciais entre os dois blocos. {§} O governo brasileiro anunciou que vai cancelar ou renegociar cerca de US$ 900 milhões em dívidas de países africanos, em uma tentativa de estreitar as relações econômicas com o continente. {§} Entre os 12 países beneficiados estão o Congo-Brazzaville, que tem a maior dívida com o Brasil – cerca de US$ 350 milhões, Tanzânia (US$ 237 milhões) e Zâmbia (US$113 milhões). {§} As transações econômicas entre Brasil e África quintuplicaram na última década, chegando a mais de 26 bilhões no ano passado. {§} O anúncio foi feito durante a visita da presidente Dilma Rousseff à África – a terceira em três meses – para participar, na Etiópia, do encontro da União Africana para celebrar os 50 anos da instituição. {§} Além dos três países já citados, também serão beneficiados Senegal, Costa do Marfim, República Democrática do Congo, Gabão, República da Guiné, Mauritânia, São Tomé e Príncipe, Sudão e Guiné Bissau. {§} 'O sentido dessa negociação é o seguinte: se eu não conseguir estabelecer negociação, eu não consigo ter relações com eles, tanto do ponto de vista de investimento, de financiar empresas brasileiras nos países africanos e também relações comerciais que envolvam maior valor agregado', disse Dilma. 'Então o sentido é uma mão dupla: beneficia o país africano e beneficia o Brasil.' {§} De acordo com o porta-voz de Dilma, Thomas Traumann, quase todas as negociações envolvem cancelamento das dívidas. O restante, segundo, ele envolve menores taxas e prazos mais longos de pagamentos. "Manter relações especiais com a África é estratégico para a política externa do Brasil", disse. Ele afirmou ainda que praticamente o total das dívidas foi acumulado nos anos 70 e já havia passado por outras renegociações. {§} O Brasil vem expandindo suas relações econômicas com a África, que é rica em recursos naturais, na chamado coperação Sul-Sul. As negociações entre Brasil e países africanos subiram de U$ 5 bilhões em 2000 para US$ 26,5 bilhões no ano passado. {§} Na África, empresas brasileiras investem pesado em setores como o petrolífero e o de mineração e em grandes obras de infraestrutura. O Brasil também abriu 19 novas embaixadas na África na última década." (http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2013/05/130520_perdao_africa_mdb.shtml; acesso em 27.5.2013).

terça-feira, 14 de maio de 2013

Mais uma prova científica recente, da relação entre pensamento e saúde.

Saúde

Cérebro

O efeito nocebo

Como a mídia e os médicos podem afetar negativamente a saúde dos pacientes apenas com a palavra
por Rogério Tuma — publicado 10/05/2013 00:00, última modificação 14/05/2013 09:37
  
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Cérebro

"O cérebro é maior do que o céu", Emily Dickinson. Foto: [Marco...]/ Flickr

O efeito nocebo ocorre quando um tratamento falso inflige sintomas indesejáveis. É o inverso do efeito placebo, caracterizado pela melhora do quadro do paciente apenas pelo efeito psicológico, quando ele recebe um tratamento simulado. A sugestão negativa ou o efeito nocebo ocorre sempre que existirem expectativas negativas, que são frequentemente provocadas quando médicos, por exemplo, explicam todas as complicações que podem ocorrer durante um procedimento indicado ao seu paciente.

Uma parte dos efeitos colaterais das drogas ocorre também por essa indução psicológica, quando, por exemplo, o paciente lê uma bula e passa a sentir os efeitos colaterais descritos nela, ou quando um paciente está sob teste de uma nova medicação, ingere uma cápsula sem a droga, mas começa a ter os mesmos efeitos colaterais descritos pelo medicamento verdadeiro. Essas reações ocorrem por dois motivos: o condicionamento pavloviano e a reação psíquica às expectativas. Uma maneira de se reduzir isso é evitar tocar no assunto "efeito colateral", o que interfere na questão ética de esclarecer o que será feito com o paciente e quais os riscos. A saída, portanto, é reforçar as vantagens do tratamento proposto.

A mídia também tem um papel alimentador de efeito nocebo, pois toda vez que divulga supostos efeitos danosos de uma substância ou produto pode induzir pessoas sugestionáveis a apresentar sintomas ou até mesmo doenças imputadas ao uso do produto. Um fenômeno que pode indicar o quanto o efeito nocebo está presente em nossas vidas é a chamada hipersensibilidade eletromagnética, que é definida por mal-estar desencadeado por exposição a ondas eletromagnéticas, como as emitidas por telefones celulares. A existência dessa condição é bastante questionada, mas algumas pessoas se queixam de dor de cabeça, tontura, queimação ou formigamento na pele quando expostas a equipamentos eletrônicos. Alguns indivíduos até evitam o convívio o social e se mudam para áreas remotas com menos eletricidade.

Com o auxílio de exames de ressonância magnética pode-se demonstrar que áreas ligadas à sensação de dor estão ativadas no cérebro dessas pessoas quando estão tendo o mal-estar. Ainda que a doença não seja real, os sintomas são.

O doutor Michael Witthoft, da Universidade Johannes Gutenberg, da Alemanha, e o doutor James Rubin, do King's College de Londres, estudaram a hipersensibilidade eletromagnética e concluíram que ela pode muito bem ser um nocebo. Em seu estudo, colocaram 147 voluntários para assistir a dois documentários. Parte dos voluntários assistiu um filme sobre os potenciais efeitos nocivos dos telefones celulares e aparelhos de rede Wi-Fi e a outra parte assistiu a outro filme que descrevia como esses aparelhos eram seguros. Em seguida, todos os indivíduos eram expostos a ondas de rede Wi-Fi, que se dizia serem reais, mas na verdade não existiam. Resultado: 54% dos voluntários descreveram sensações associadas  à  hipersensibilidade, dois precisaram abandonar o estudo, pois não suportaram os sintomas ocasionados pelas ondas imaginárias. Apesar de ambos os grupos apresentarem sintomas, o grupo que assistiu ao documentário que mostrava os perigos dos aparelhos foi o que mais apresentou sintomas.

O dr. Wittihoft acredita que a simples antecipação de efeitos colaterais pode desencadear dor e distúrbios, e assim, a mídia sensacionalista pode interferir negativamente na saúde de grande parte da população quando divulga dados sem base científica sobre riscos de um determinado produto ou medicamento criando verdadeiras neuroses ou até doenças.